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terça-feira, 15 de julho de 2014

Mestrar, a 4ª Pauta Criativa

A Teoria GNS está completa? É verdade que só existem 3 pautas criativas (expectativas dos jogadores a respeito da sessão de jogo) possíveis numa partida de RPG (jogos de papéis)?

 Teoria GNS e O Grande Modelo

O coletivo The Forge desenvolveu a Teoria GNS (Gamism-Narrativism-Simulationism) das pautas criativas dos designers para os diferentes tipos de jogadores a partir dos três jogos de papéis mais paradigmáticos à época, respectivamente: Dungeons & Dragons (Ludicista), Vampiro a Máscara (Narrativista), e GURPS (Simulacionista). Posteriormente eles expandiram essa teoria (The Big Model) incluindo quatro dimensões das sessões de jogos de papéis, atravessadas transversalmente por uma ou mais dessas pautas criativas: o Contrato Social (a concordância em jogar), a Exploração (a ficção compartilhada), a Técnica (as regras operacionais do jogo) e as Efemeridades (o registro mais detalhado do que acontece durante o jogo).

Pilares da Aventura

O recém-lançado Manual Básico da 5ª Edição de Dungeons & Dragons afirma que os três pilares da aventura são o Combate, a Interação Social e a Exploração, talvez como uma forma de agradar diretamente às preferências dos jogadores adeptos de cada uma das três pautas criativas: Ludicistas (Combate, dimensão da Técnica), Narrativistas (Interação Social, dimensão do Contrato Social) e Simulacionistas (Exploração, dimensão Exploratória).

Perfis Comportamentais e Modos Cognitivos

É interessante notar que o objetivo da Teoria GNS era mais categorizar e analisar os próprios jogos do que as preferências de seus jogadores, porém, se considerarmos que há jogadores que preferem um dos pilares da aventura aos outros dois, podemos fazer uma analogia à teoria dos perfis comportamentais e, mais recentemente, a Teoria dos Modos Cognitivos de Stephen Kosslyn e Wayne Miller, baseada na neurociência, com os Ludicistas representando o perfil Executor e o modo cognitivo Mobilizador; os Narrativistas, o perfil Comunicador e o modo cognitivo Adaptor; e os Simulacionistas, o perfil Analítico e o modo cognitivo Perceptor.

O 4º Elemento

Porém o perfil Planejador e o modo Estimulador não parecem representar nenhuma pauta criativa nem dimensão do jogo deste modelo, até que você se lembra que há um outro participante nesse jogo que parece ter sido esquecido: aquele que mestra!

A Última Pauta Criativa

Aquele que mestra seria correspondente à dimensão das Efemeridades, ao perfil Planejador e ao modo cognitivo Estimulador, mas teríamos que criar uma quarta pauta criativa e um quarto pilar da aventura só para ele como Administrador da Experiência de Jogo. E essa quarta pauta criativa tem sido cada vez mais compartilhada entre os participantes dos sistemas de jogos de papéis mais recentes, com o sacrifício de seus pontos heroicos e o acionamento das complicações de seus personagens permitindo interferir na narrativa, ou com jogos narrativos sem um mestre, como Fiasco.

Categorias Fluidas

Vale lembrar que uma mesma pessoa pode apresentar todos os quatro modos cognitivos conforme a necessidade de pensar de cada situação, e que os diferentes perfis comportamentais podem ser desenvolvidos se uma pessoa possui um ou outro mais destacado que os outros. Da mesma forma a preferência de um criador de jogos ou de um jogador por uma pauta criativa específica pode variar com uma mudança de opinião a respeito do tipo de jogo que se prefere num determinado momento de sua vida, ou com a vontade de experimentar coisas novas.

terça-feira, 29 de abril de 2014

Harry Potter e os insetos espaciais!

Assisti ao filme "O Jogo do Exterminador", originalmente chamado "Ender's Game", baseado no livro de mesmo nome e vi muito de Harry Potter numa ficção científica com algo de Space Rogue.


Explico: a solução da trama do RPG eletrônico Space Rogue chega à mesma conclusão do filme em relação a uma raça alienígena também insetóide (nada de spoilers). Quanto a Harry Potter, talvez seja porque o protagonista é um moleque talentoso que vai para um colégio especial onde pode desenvolver seus "poderes" numa espécie de "quadribol" estratégico. E como eles usam Drones em escala estratégica em vez de tática, evitam a comparação com o filme e o livro Tropas Estelares.


O filme é bem mais ou menos, a não ser se você for um órfão de Harry Potter, porém recomendo o jogo Space Rogue, que tem uma trama muito bem elaborada, viagens e batalhas espaciais tridimensionais e roda em qualquer PC com DOSBox! É bom ver um RPG de ficção científica que não tenha estética oriental, só para variar.

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

Aquecendo os motores para o FVM 2014

Já virou tradição o concurso de criação de jogos Faça Você Mesmo (FVM) da Secular Games, e é esperado que neste carnaval de 2014 eles tragam ainda novidades nas regras do concurso para temas de jogo, tentando superar os ícones trazidos pelo Game Chef 2013 e as músicas trazidas pelo Orquestra RPG.

Como não dá para adivinhar como serão e quais serão os temas para o jogos, é preciso que os participantes se preparem jogando jogos diferentes para ampliarem seu repertório, lendo livros sobre design de jogos como os da série Regras do Jogo e seguindo princípios como o de tentar criar um jogo que você gostaria de jogar com seus amigos.

Porém há uma outra coisa além dessas três que eu gosto muito de fazer nesses concursos que é criar protótipos como PROVAS DE CONCEITO para algum desafio de design que eu queira superar como jogueiro (designer de jogos).

Definição: Protótipo de prova de conceito é um termo usado para designar um produto construído em moldes semelhantes aos de um protótipo de engenharia, mas um cujo intento seja somente o de demonstrar a viabilidade de um novo produto ou de uma nova técnica de fabricação, e que não foi concebido para ser uma versão inicial de um design de produção.

O problema é que às vezes o conceito a ser provado é tão diferente dos jogos tradicionais que acaba tornando o jogo criado uma mera curiosidade não muito divertida de ser jogada. Eis um novo desafio de design que assumo para os concursos deste ano, criar uma prova de conceito que seja algo que o próprio jogueiro acharia legal de se jogar com os amigos.

domingo, 12 de janeiro de 2014

Motivos para vilões cometerem crimes

Fáleas sustenta que a igualdade da riqueza, ao assegurar o suprimento das necessidades, e ao impedir que se sinta frio ou fome, evita os roubos de roupas e comida. Mas a necessidade não é o único incentivo ao crime. Também há quem deseje desfrutar coisas há muito cobiçadas; e, se o desejo vai além das meras necessidades, os homens buscam o remédio no crime. Todavia, tampouco é esse o único motivo; as pessoas também desejam gozar de prazeres, sem esforços nem dores. Desse modo, existem três diferentes espécies de homens e de tratamentos: para o primeiro tipo (os que roubam para viver), tem-se de oferecer emprego e o bastante para uma vida sem necessidades; para o segundo, autocontrole (precisa aprender a conter seus desejos). Para o terceiro, caso pretenda encontrar prazeres nele mesmo, apenas a filosofia fornecerá as respostas; para todos os outros prazeres dependemos dos outros. Crimes mais graves, os homens os cometem quando seus objetivos são extravagantes, não para ver supridas suas necessidades. Quem já ouviu falar de um homem que se tornou tirano porque queria se manter aquecido? Pelo mesmo motivo, a magnitude do crime, há mais honra em assassinar um déspota do que um ladrão. Assim, podemos concluir que a Constituição de Fáleas impediria apenas os crimes menores.

Aristóteles, Política, Livro II, Parte 7


De maneira semelhante, entre os homens há variadas maneiras de viver: primeiro, existem os nômades; estes têm pouco trabalho, porque a tarefa de alimentar animais domésticos pode ser realizada com um mínimo de labuta e um máximo de facilidade; mas, quando eles precisam ser removidos para pastos frescos, os seres humanos têm de acompanhá-los, constituindo, por assim dizer, uma fazenda móvel. Depois vêm os caçadores, ou melhor, todos aqueles que vivem daquilo que pegam; alguns simplesmente tomam de outros, enquanto os demais, os pescadores, precisam morar nas proximidades de lagos, pântanos, rios ou da parte do mar onde há peixes; outros vivem do abate de pássaros e de animais selvagens. A terceira classe, a maior delas, vive do cultivo da terra.
Essas portanto são as principais formas de vida, isto é, as auto-suficientes, não aquelas que dependem do comércio e da troca. São elas o nomadismo, a agricultura, a pirataria, a pesca e a caça. Muitos vivem bem combinando alguns desses tipos, suprindo as deficiências de um com a adição de outro, no ponto em que o anterior falha; essas combinações são, entre outras, nomadismo e pirataria, agricultura e caça. As pessoas que se dedicam a isso são compelidas pelas próprias necessidades.

Aristóteles, Política, Livro I, Parte 8

Eis quatro motivos básicos para que os vilões e seus capangas cometam crimes, além de uma explicação plausível para a existência de bárbaros e salteadores. Quanto ao momento desses crimes serem cometidos, dependem da conveniência e da oportunidade (conforme pode-se inferir da leitura do livro "Crime e Castigo").

Quanto à variedade de crimes que podem ser cometidos, recomendo a consulta da Parte Especial (a partir do artigo 121) do nosso Código Penal. Isso pode ajudar o Mestre de Jogo a ter ideias mais ricas para sua sessão do que sempre o mesmo batido "assalto ao banco". Mas cuidado, Mestre de Jogo, para não incluir conteúdo muito "pesado" quando for jogar com crianças.

quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

Programando manuais de instruções

Os jogos presenciais, como os JPs (Jogos de Personificação) por exemplo, dependem de dois tipos de recursos básicos para suas sessões de jogo: a plataforma física e o suporte antropológico.

A plataforma física de um jogo presencial inclui tanto as condições ambientais (ex.: sala com mesa e cadeiras, quadro branco, aparelho de som, etc), quanto os dispositivos (ex.: instrumentos de aleatoriedade como moedas ou dados poliédricos ou cronômetros ou baralhos, manuais de referência, formulários impressos em papel A4, etc) dos quais depende a sessão de jogo.

Já o suporte antropológico são as pessoas que participam do jogo, cujos sistemas sensório-cognitivos-motores base (seus corpos e mentes) atuarão sobre a plataforma física para que ocorra a sessão de jogo na dimensão imaginária compartilhada (na forma de convenções presumidas) de suas mentes. Mente essa que inclui os estados emocionais dos participantes, cujo estímulo ou inibição costuma definir o gênero narrativo a ser vivenciado (ex.: comédia, drama, ação, terror, etc).

E é sobre os sistemas sensório-motores base do suporte antropológico que os criadores de jogos presenciais atuam, "programando-os" por meio das instruções de jogo, para que o jogo se torne possível.

A "linguagem de programação" de jogos presenciais é composta por quatro classes de comandos (instruções) básicos:
  1. Sinta algum estímulo ambiental específico (ouça, veja, observe, leia, etc);
  2. Medite a respeito de algo específico (decida, escolha, lembre-se, imagine, etc);
  3. Expresse o pensamento ou vontade resultante (faça uma cara, assuma uma postura, gesticule, mexa num dispositivo, cante, fale, etc);
  4. Salte para outra instrução posterior ou anterior a esta.
Por exemplo, ao se jogar um JP clássico, o administrador da experiência de jogo (vulgo "mestre de jogo") após ter lido o manual do jogo (ou seja, após ter recebido os estímulos proporcionados pela leitura), descreve um cenário fictício (ou seja, expressa pelos movimentos de seus órgãos de fala) para o grupo de jogadores (que então recebem tais estímulos) e pede que descrevam como seus personagens pretendem agir (ou seja, que pensem e depois que expressem por meio da fala o que imaginaram). O administrador da experiência de jogo então percebe que um dos jogadores descreveu que seu personagem tentará executar uma ação desafiadora dentro do espaço imaginário compartilhado, então o administrador recorre às regras de teste de habilidade de seu manual (saltando então para uma instrução que requer o manuseio de dados poliédricos e a comparação com informações escritas no formulário de personagem do jogador).

A princípio pode parecer complicado, mas é uma forma de pensar a criação de jogos que permite elaborar as instruções em detalhes, além de permitir que seja escrita em diversos estilos a fim de obter experiências de leitura e de jogo distintas.